O mundo do trabalho no Brasil vem passando por profundas transformações. Com a escassez de vagas com carteira assinada, cresce o número de pessoas atuando por conta própria, seja como autônomos, microempreendedores individuais (MEIs), profissionais liberais ou trabalhadores informais. Mas nem todos esses modelos oferecem a mesma proteção ou garantias.
De acordo com o IBGE, o trabalhador por conta própria é aquele que atua sem subordinação e sem empregar outras pessoas. Isso inclui desde ambulantes e motoristas de aplicativo até profissionais como arquitetos e fotógrafos. Essa categoria abrange diferentes graus de formalização — e, com isso, diferentes níveis de segurança social.
Segundo o pesquisador do Ipea, Felipe Vella Pateo, nem todo trabalhador informal é autônomo. “Há aqueles que trabalham para alguém, mas sem carteira assinada. São os chamados assalariados informais, que deveriam estar protegidos pela CLT, mas não estão”, explica.
Vantagens e riscos de cada modelo
A informalidade costuma ser vista como um caminho mais fácil e rápido para o ingresso no mercado de trabalho. Não exige contrato, não há chefe direto e, muitas vezes, o trabalhador consegue maior flexibilidade de horário. No entanto, essa liberdade tem um custo alto: ausência de benefícios como aposentadoria, seguro-desemprego e proteção em caso de acidentes.
A procuradora do Trabalho, Viviann Brito Mattos, alerta que a informalidade representa mais do que a falta de registro. “Ela é uma forma estrutural de exclusão, marcada pela insegurança de renda e pela ausência de direitos básicos”, afirma.
Já o MEI é uma alternativa para quem quer formalizar sua atividade de forma simplificada. Com um CNPJ ativo, o microempreendedor pode emitir nota fiscal, pagar uma contribuição reduzida à Previdência e ter acesso a benefícios como aposentadoria e salário-maternidade. Em 2022, o Brasil já contava com mais de 14 milhões de MEIs — um número que não para de crescer.
Apesar das vantagens, o MEI tem limitações. Só pode faturar até R$ 81 mil por ano e, para ter acesso a uma aposentadoria por tempo de contribuição, precisa complementar os pagamentos ao INSS.
A linha tênue entre autonomia e fraude
Nos últimos anos, muitos trabalhadores passaram a atuar como “pessoa jurídica” mesmo em relações que, na prática, deveriam ser regidas pela CLT. Esse fenômeno, conhecido como pejotização, vem sendo combatido pelo Ministério Público do Trabalho e analisado pelo Supremo Tribunal Federal.
“Quando há pessoalidade, habitualidade, subordinação e pagamento de salário, existe vínculo de emprego — mesmo que haja um CNPJ envolvido”, afirma a procuradora Priscila Dibi Schvarcz. A prática da pejotização é considerada fraude, pois mascara uma relação de emprego para evitar encargos trabalhistas.
O papel da CLT no atual mercado
Com o aumento da informalidade e a popularização do empreendedorismo, muitos jovens passaram a ver o emprego com carteira assinada como algo ultrapassado ou até indesejável. Mas essa percepção pode ser enganosa.
“O trabalho formal continua sendo a principal via de acesso a direitos sociais e estabilidade”, reforça Viviann Mattos. Para ela, defender o regime celetista é essencial para combater a precarização das condições de trabalho.
Como escolher o melhor modelo?
A escolha entre trabalho formal, autônomo, MEI ou informal deve levar em conta mais do que a renda imediata. Segurança, acesso à previdência e estabilidade são pontos fundamentais para o futuro. Formalizar uma atividade pode parecer burocrático, mas oferece uma rede de proteção importante — especialmente em momentos de crise.
A liberdade no trabalho vai além da autonomia de horários. Ela está na possibilidade de viver com dignidade, com proteção e acesso a direitos. E, nesse aspecto, a formalidade ainda é o caminho mais seguro.
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